terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Paris, em atraso.



Não sei, meu amor.
É essa a verdade.
Não sei se a vida nos prometeu Paris, a torre Eiffel à espreita e a Notre-Dame a benzer-nos as testas, em profunda reverência. Não sei se algum dia vou ver-te de branco, figura sacra sobre o altar, os lábios a lembrar o escarlate das tuas unhas, quando ainda te sonhava em segredo. E as pombas em alvoroço, a insultar S.Pedro e o vento que se levantou, e eu a saber que é em tua homenagem que ele grita.
Não sei se ainda há tempo para chegares à hora marcada, desalinhada e absorta, as mãos demasiado pequenas, os braços demasiado compridos, o teu andar sobranceiro. Não sei se quando chegares, vais abrir a porta deste bistrot , galgar as escadas duas a duas e dar um último olhar ao espelho que te recebe no segundo andar. E se, depois, vais procurar-me, arregalar muito os olhos e, enquanto chove lá fora, perceber que chegaste atrasada.
Mas sei que, nessa altura, vou debruçar-me sobre o Sena, falar à minha mãe e a quem já cá não está, e prometer a mim mesma que salto, quando o primeiro carro virar à direita. E em hesitação, sob a chuva, vê-lo travar, enquanto dobra a esquina. E aí, aí mergulhar sempre, o corpo a entregar-se ao embalo, descarnado em arrepios, avesso à respiração.
A tua voz a dizer que sim, a Notre-Dame a abençoar-nos e a minha pele azulada, o cabelo a lembrar um véu, de luto pelo meu Sacré-Coeur.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Muito mais.

Fight Club


Fui mesmo até ao topo
para nos atirar
na forma de dois cêntimos,
as moedas caindo
em tristes linhas paralelas,
o espaço entre elas
vazio como o não-espaço
entre os arranha-céus erguidos em separado.
Mas cometi o erro de esperar
até que a cidade se iluminasse
em resposta ao crepúsculo
e com o crepúsculo
veio o vento e com o vento
neve como a neve de um filme.
Tão mágica que era como se
estivesses comigo
a tomar posição sobre os acontecimentos,
a tornar direitas linhas curvas,
a deslizar a tua mão fria
debaixo do meu casaco, procurando a pele
lisa das minhas costas, depois reclamando o direito
ao meu seio, incendiando-me.
As pessoas abandonariam o Norte o Sul e o Leste
para virem assistir
ao que se estava a passar na parte Oeste,
e à medida que o 80º piso se tornasse no 79º
e este no 78º, tu dirias Sabes,
sempre merecemos muito mais do que isso.



Empire State Building - Helen Farish.